“Apesar das críticas, nada importa além de ajudar minha família”: diz ator sobre carreira no OnlyFans - Revista Esquinas

“Apesar das críticas, nada importa além de ajudar minha família”: diz ator sobre carreira no OnlyFans

Por Lucas De Lucia, Maira Pilão e Vitória Antunes : fevereiro 1, 2022

Bruno Paz reinventou sua carreira durante a pandemia na polêmica plataforma OnlyFans.

Sem oportunidades em sua área, paulistano conta sua trajetória para se consolidar na polêmica rede de conteúdo explícito OnlyFans

Bruno Paz, de 23 anos, encontrou no Onlyfans, uma forma de se sustentar e dar a família coisas que, segundo ele, jamais conseguiu em empregos formais: “Apesar das críticas que chegam, eu acho que nada mais importa além de poder ajudar a minha família”.

Cena 1 – Antelóquio

O terceiro sino acaba de tocar. A tensão toma conta do anfiteatro, e por 45 minutos todos os olhos se voltam ao espetáculo que toma conta do palco. Todos os corações presentes na plateia batem em uníssono, todo o sangue presente na audiência corre em uníssono, acompanhando cada entonação, cada lágrima e cada vibração dos atores sob os holofotes. Por um breve período, o espetáculo é tudo que importa. E o teatro é isso: é encontro, é harmonia, é convergência do aflorar de sentimentos que por vezes os espectadores sequer sabiam possuir.

O teatro brasileiro vibra e faz vibrar, mas também sofre. A falta de incentivos para que atores e professores permaneçam produzindo arte faz com que cada vez mais profissionais abandonem a paixão shakespeariana e migrem para caminhos mais tradicionais no que diz respeito à suas carreiras – mas tradicional talvez não seja o termo ideal a ser usado.

É nessa ambientação datada do primeiro semestre de 2020 que se encontra Bruno Paz, paulistano e residente do Grajaú, no extremo sul de São Paulo. Formado em artes cênicas pelo Teatro Escola Macunaíma e pela Faculdade Estácio, durante quatro anos Bruno foi professor de teatro para crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade na cidade, mas o fechamento de escolas na pandemia fez com que saísse em busca de outra forma de renda.

“Então, eu trabalhava com aglomerações, né? E essas foram as primeiras a serem cortadas”, conta. A missão de encontrar uma nova forma de sustento quando toda a vida que se conhece é rodeada de pessoas, de toques e da exacerbação de qualquer movimento trazia uma dificuldade: era preciso se desvencilhar de tudo que até então era rotina.

Durante uma conversa com um colega, Leonardo Abreu, Bruno foi apresentado ao OnlyFans – uma plataforma digital originalmente criada para a comunicação entre fãs e artistas, mas que atualmente concentra uma grande quantidade de conteúdo pornográfico e erótico. A ideia é simples: em troca de uma mensalidade que pode variar entre 5 e 50 dólares, os ‘fãs’ recebem conteúdos exclusivos daqueles que desejam acompanhar. “Eu sempre fiz nu artístico, nunca tive vergonha do meu corpo – então, pensei, por que não?”, comenta o ator.

OnlyFans

Bruno Paz, ator que migrou sua carreira para a plataforma OnlyFans durante a pandemia.
Acervo Pessoal

Veja mais em ESQUINAS

Dos tatames ao Instagram, Gabrielle Tairini relata sua trajetória com o brechó Wild Tropical

Cofundadora do grupo de teatro em ônibus Zózima Trupe fala sobre fim de parceria durante pandemia: “É teatro que a gente quer fazer”

Prostituição em meio à pandemia: “A gente corre o risco da covid e da vida”

Cena 2. Interlúdio

Leonardo Abreu, de 25 anos, era a autoridade no assunto que Bruno precisava para se guiar no mar desconhecido do erotismo virtual. Com mais de 115 seguidores acumulados na plataforma, ele conta: “A ideia inicial do OnlyFans de pagar pra ver algum artista meio que se mantém até hoje. Quer dizer, ninguém vai pagar muitos dólares por mês para ver fotos de quem não conhece. Por isso, o ideal é tentar construir uma base de seguidores em alguma rede social antes de tentar lucrar com isso; é um negócio que não vem do dia pra noite”.

E foi o script que Bruno seguiu: em julho de 2020 o ator criou uma conta no Twitter, rede social que permite a publicação de conteúdo erótico explícito, onde um ano depois acumula mais de 80 mil seguidores. Depois, veio o Instagram – rende em que possui mais de 20 mil seguidores. E, em março de 2021, veio de fato o OnlyFans.

Atualmente, Bruno detém uma média de 80 assinantes por mês no OnlyFans, cada um pagando US$ 20 – “isso é, fora alguns mimos em dinheiro extras que o pessoal me manda quando gosta muito de alguma foto ou vídeo. É o jeito deles de me mostrarem que aquele conteúdo agradou, e eu retribuo o carinho produzindo ainda mais. Em uma média são 80 [seguidores], mas muitas pessoas não renovam a assinatura depois do primeiro mês”.

E, ao que parece, o segredo para o sucesso está mesmo na exposição – tanto Leonardo quanto Bruno abriram mão do uso de pseudônimos para o site. Eles não escondem nada – tanto física quanto emocionalmente. “Não me escondo atrás de um personagem, então o pessoal acaba sabendo quando eu estou triste ou mais desanimado, por exemplo. Existe até um gringo que me adora, me manda mensagens sempre. É Sam o nome dele. Ele gosta do meu estilo funkeiro, sente tesão num estilo mais brasileiro. Eu sou eu mesmo, e acho que é isso que cativa o público a querer me conhecer melhor”, conta Bruno.

Entretanto, num ambiente virtual onde qualquer descoberta mora há poucos cliques de distância, a exposição demasiada acaba cobrando seu preço: a erotização ainda é um tabu, e como Bruno utiliza seu nome verdadeiro e suas redes sociais, era só uma questão de tempo até que o assunto chegasse até sua família. Ele relata: “Eu falei para os meus pais, achei que fosse melhor eles ouvirem isso da minha boca do que acabar clicando em um link na internet na surpresa. Minha mãe é muito tranquila, só queria saber se eu estava feliz e se esse negócio de internet dava dinheiro mesmo. Já meu pai…”.

O pai de Bruno, José Paz, é a face estampada de uma geração mais conservadora que cresceu acreditando que sexo devesse ficar exclusivamente entre quatro paredes. Ele simboliza o pensamento de que o erótico está automaticamente ligado ao vulgar e em uma situação de margem social – coisa que “não é lugar de gente estudada e formada como meu filho”.

Aos poucos, porém, as luzes do teatro se acendem sobre o preconceito pela situação, mostrando-a como apenas um medo do desconhecido, e preocupação com o bem-estar do primogênito. “Hoje eu entendo que foi uma escolha consciente dele, entendo que o Bruno tá seguro. Ele até me empresta dinheiro, sabia? (risos)”, afirma José.

Cena 3. Epílogo

O sucesso no OnlyFans, ainda que nichado, trouxe uma melhora significativa à situação financeira do ator e de sua família. Bruno conta emocionado sobre o momento que entendeu as proporções do que fazia: “Eu já trabalhei de tudo nessa vida. Já fui professor, repositor de mercado, tudo que você pode imaginar. Trabalho desde os 16 anos, e pela primeira vez estou tirando mais do que 2 mil reais. Esses dias eu fui com a minha mãe no mercado e falei ‘pode escolher o que você quiser, pode comprar Nescau, que é marca cara. Pode até comprar 15kg de carne se você quiser’. Perceber que eu posso proporcionar isso pra ela não tem preço”.

Mas, assim como a internet é capaz de se mover na velocidade da luz, as tendências vão tão rapidamente quanto vieram. O ator tem consciência de que esse é um negócio temporário, de que as redes sociais enfrentam hoje um momento de glória passageira e de que é urgente criar um planejamento a longo prazo.

Sobre isso, Bruno tem planos de investir em um negócio próprio – e, como frisa ele, nunca mais voltar a ter um chefe. “Antes do site eu exercia minha profissão – e amava! – mas a gente é criado para acreditar que sucesso é sinônimo de trabalhar para alguém durante 40 horas por semana e depois de 35 anos se aposentar pra descansar. Eu tô cansado agora, cara. Eu quero descansar agora, e trabalhando pra mim mesmo eu finalmente posso fazer isso”, desabafa.

Editado por Juliano Galisi e Nathalia Jesus

Encontrou algum erro? Avise-nos.