"É como explicador que quero ser lembrado": Clóvis de Barros Filho define sua filosofia - Revista Esquinas

“É como explicador que quero ser lembrado”: Clóvis de Barros Filho define sua filosofia

Por Sandra Lacerda : junho 14, 2021

Em entrevista ao CAVHCAST, o professor e escritor Clóvis de Barros Filho fala sobre felicidade e explica a “escola da tristeza”

“Talvez a felicidade seja o lamento da finitude. Quando a vida é boa, você só pode lamentar que ela acabe”. A frase de Clóvis de Barros Filho engloba um dos assuntos abordados por ele em entrevista ao CAVHCAST, programa do Centro Acadêmico Vladimir Herzog, da Cásper Líbero.

Professor e escritor, formado em direito pela USP e em jornalismo pela Cásper, Clóvis de Barros Filho é um dos principais pensadores contemporâneos do Brasil, mas não se identifica como filósofo: “Há uma distância de galáxias entre a minha capacidade intelectiva e a dessas pessoas”. Para ele, a melhor forma de identificá-lo seria como um explicador, já que tem a capacidade de transmitir seu pensamento de forma clara.

Clóvis diz acreditar que o interesse de muitas pessoas por seus livros e palestras se dá pela vontade de aprenderem mais, já que o nível atual da educação no País deixa muito a desejar.

“Se eu tiver que ser aplaudido um dia, é como explicador que quero ser lembrado”.

É com leveza e uso de exemplos que Clóvis aponta conceitos sobre a felicidade, tendo como base o seu livro “A Felicidade é Inútil”. “Somos conduzidos a pensar que o que é bom é útil e, portanto, vivemos em uma perspectiva instrumental da vida”, explica. Segundo ele, o valor da utilidade se realiza fora de si, pois “precisa de alguma exterioridade para se realizar”. Já a felicidade é inútil, pois o valor dela está em si próprio. “Uma coisa que tem valor em si mesma não depende de nenhum elemento exterior para ser valiosa”, completa.

Em contrapartida, o professor também aborda o conceito da “escola da tristeza”, no qual alunos encontram satisfação apenas em serem aprovados, e não no aprendizado. Os estudantes não se sentem motivados a se dedicarem para o crescimento intelectual próprio, mas somente para cumprirem uma meta. Isso influencia diretamente na preparação de profissionais que entrarão também no “trabalho da tristeza”. Segundo Clóvis, “a escola da tristeza é a melhor preparação para uma vida triste”.

Clóvis de Barros Filho: etapas pedagógicas

Na visão do escritor, a escola cumpre bem seu papel de prover os conteúdos didáticos necessários para que os alunos vivam em civilização, mas falha em incentivar a curiosidade pelo conhecimento diverso e em ajudar os estudantes a encontrarem seus interesses individuais. Na tentativa de solucionar esse problema, Clóvis sugere a aplicação de três tipos de experiência pedagógica: a formação moral, ética e existencial.

Para ele, ensinar princípios que auxiliem na educação moral dos alunos foi um dos papéis que a escola abriu mão. Clóvis afirma que a formação ética, por sua vez, se fundamenta na “inteligência compartilhada a serviço do aperfeiçoamento da convivência”. Dessa forma, se a moral busca princípios que se pretendam universais, haverá tantas éticas quantas forem as iniciativas de regulamentação do convívio em sociedade.

Mas, para Clóvis de Barros Filho, ser respeitador de princípios morais ou éticos não assegura a possibilidade de ter uma vida feliz: “Nada impede que você seja impecável moralmente, mas humilhado no trabalho, traído pelos amigos, que tenha lutos. Isso nada tem a ver com ser uma pessoa honesta.”

Já sobre a formação existencial, ele explica que a relação do eu consigo mesmo e com os outros ao seu redor consiste na construção de ideais ensinados e assimilados pelo indivíduo. O professor diz que não se deve pensar que a função dessas etapas de instrução é somente docente, mas que a prática precária dessas experiências pedagógicas mantém muitos alunos ainda presos na “escola da tristeza”.

Projetos e pandemia

Em tempos de pandemia, a tristeza se torna um sentimento recorrente. No entanto, Clóvis de Barros Filho afirma que precisamos valorizar a única vida que temos, ainda que seja em quarentena. Para ele, em momentos como esse, a felicidade pode ser alcançada quando damos valor ao que fazemos.

Pensando nisso, a partir do mês de julho, o professor iniciará um projeto chamado “Lendo com o Clóvis”, em que lerá e comentará, junto de seus ouvintes, livros de seu interesse. Segundo ele, a primeira obra da iniciativa será 1984, de George Orwell.

“Não quero ficar lendo sozinho, então vou colocar na internet e fazer disso um programa que permita que as pessoas leiam comigo. Vou fazer esse trabalho de atrair o leitor para o encantamento com a leitura”, conta.

Clóvis diz que não precisamos esperar a pandemia acabar para iniciar projetos: “Faz um ano que estou dizendo isso, até por que não há nenhuma garantia de que vamos estar aqui quando ela acabar. É melhor viver a vida onde ela está”, conclui.

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O escritor também destaca seu novo livro, “Epaminondas Badaró na floresta dos filósofos”. Inspirada na história de Buda, a obra tem como objetivo instruir crianças sobre o mundo da filosofia de uma forma lúdica e de fácil compreensão. “As ideias centrais de cada pensador estão ali explicadas, mesmo para o entendimento de um gato budista”, brinca.

Segundo o autor, mesmo que seja um livro infantil, muitos adultos poderão encontrar nele esclarecimentos da filosofia. “Quando escrevemos para crianças, podemos fazer aquelas perguntas que todo adulto gostaria de encontrar”, diz. “São tomadas por bobas, mas, às vezes, são muito necessárias”.

Para assistir à entrevista na íntegra, clique aqui.

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