Sem sessões presenciais de fisioterapia, jovens com deficiência enfrentam desafios na pandemia - Revista Esquinas

Sem sessões presenciais de fisioterapia, jovens com deficiência enfrentam desafios na pandemia

Por João Malafaia : julho 3, 2020

Beatriz Ban

O atendimento à distância tenta substituir tratamentos essenciais para esse grupo que também vem sofrendo com o acompanhamento escolar remoto 

Luciana Igliori percebeu, logo no começo da pandemia, que a quarentena não seria nada fácil. Ela é mãe de Beatriz, uma jovem de 17 anos com paralisia cerebral severa e, juntas, elas viviam uma rotina acelerada. Beatriz precisa de cuidados 24 horas por dia e, antes da chegada do novo coronavírus, tinha consultas semanais de fonoaudiologia e fisioterapia motora e respiratória – além da escola especializada todos os dias. Assim era a rotina de Beatriz e de muitos outros jovens com deficiência no Brasil, que, frente à pandemia, tiveram de adaptar suas necessidades à nova realidade. 

“Logo que começou a pandemia, eu parei de levá-la para as consultas e para a escola”, explica Luciana. Devido à paralisia cerebral, Beatriz também tem problemas respiratórios, o que aumentou a preocupação dos pais. Por ser fonoaudióloga, a mãe consegue fazer alguns exercícios em casa, mas a fisioterapia respiratória e a motora estão sendo um problema. “A respiratória a gente tem feito de maneira bem esporádica, porque temos de ir até o consultório”, explica ela. “Já a motora é guiada online, uma vez por semana, e, nos outros dias, eu tento fazer sozinha”. Em casa, os exercícios são mais leves e limitados, principalmente pela falta de equipamentos e instrução. Isso é preocupante, já que a fisioterapia motora é vital para evitar a atrofiação dos músculos e melhorar a circulação sanguínea pelos membros. 

Pessoas com deficiências intelectuais e dificuldades cognitivas também podem se prejudicar com o acompanhamento escolar remoto, uma vez que estar presente é essencial para elas. “Quando se trabalha com crianças e jovens autistas, você precisa entrar no mundo deles”, explica Amanda Zamborlini, irmã de Lucca, um adolescente de 15 anos com autismo. “Se ele deita no chão, você deita junto para conversar, para ele entender que vocês estão no mesmo plano. Remotamente, é difícil fazer isso.” Amanda é designer e precisa explicar matérias como química e física para o irmão, que frequenta tanto o ensino regular quanto o especial. Para eles, o formato virtual tem se mostrado pouco eficiente.  

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Fabiana Duarte é psicóloga, pedagoga e idealizadora do Simbora Gente, um instituto que promove eventos, atividades e conversas, principalmente para pessoas com autismo e síndrome de down. Desde março, todos os encontros do instituto estão sendo realizados remotamente, mas o número de adesões está abaixo do esperado. “Alguns jovens se adaptaram, mas muitos não”, relata Fabiana. “A gente até abriu para novos inscritos, mas não foram muitos que se interessaram.” Ela conta que, além da desistência de alguns jovens em relação à iniciativa, o instituto também perdeu apoiadores financeiros, o que resultou no corte de programas e funcionários. 

Para Eliana Cunha, coordenadora de educação inclusiva na Fundação Dorina Nowill para Cegos, o apoio da família é essencial neste momento. “Com os profissionais distantes, os pais precisam se apropriar desses assuntos para poder acompanhar e auxiliar os filhos deficientes”, explica ela. Para os jovens cegos ou com baixa visão, ainda há um agravante pela situação atual: eles precisam do tato, é tocando que eles conhecem o mundo e se localizam, mas também é assim que o vírus se espalha. “Não tem como a gente falar para eles pararem, principalmente com as crianças que ainda estão desenvolvendo a habilidade”, diz Eliana. “O que nós podemos passar são instruções de como se precaver após o contato com as superfícies.” 

Para todas as entrevistadas, é importante que as famílias expliquem aos jovens com deficiência a situação atual do mundo e como isso afeta as suas vidas. “A acessibilidade se dá pela informação,” opina Fabiana. “Precisamos ir e voltar, explicar e explicar de novo o que está acontecendo e, com o tempo, a informação vai se fixando.” E Eliana completa, “precisamos cuidar das pessoas mais vulneráveis, e isso inclui aquelas com deficiência”. Jovens com deficiência – e seus pais – já vivem em constante alerta e preocupação, a pandemia do coronavírus só agrava esse quadro.