Entenda o impacto da paralisação das aulas na rotina dos motoristas de vans escolares - Revista Esquinas

Entenda o impacto da paralisação das aulas na rotina dos motoristas de vans escolares

Por Thayse Maia, aluna do projeto Redação Aberta #1* : maio 28, 2021

Foto por: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Com escolas fechadas e sem previsão de retorno das aulas, motoristas de vans escolares precisaram encontrar outras formas de manter a renda durante a pandemia

Marcela Bachir, de Sorocaba, São Paulo, herdou a profissão de condutora de vans escolares de seus pais e há 16 anos realizava o transporte escolar junto ao marido e a sua mãe: “Meu pai se aposentou conduzindo vans”. A alternativa encontrada por muitos motoristas foi abrir algum tipo de negócio, como é o caso de Marcela que começou a fazer doces, marmitas e sopas fitness para vender.

A ideia surgiu quando começou uma nova dieta e teve dificuldade em encontrar alternativas saudáveis para incluir em sua alimentação. E foi falando com uma amiga que a ensinou receitas e também vendia comidas saudáveis, que Marcela teve a ideia de abrir o Tô Fit.

“Queria vender as vans para pagar as dívidas e para ter um dinheiro que desse para se manter até voltar tudo”, disse Marcela
Acervo Pessoal

O economista e professor da Faculdade Cásper Líbero, Adalton Franciozo Diniz, pontuou: “Se a economia não cresce e não tem oportunidade de emprego, essas pessoas terão de buscar outros meios de sobrevivência”. Marcela revela que não foi a única de seus colegas que teve que se adaptar: “Um rapaz, também motorista, montou um sacola cheia”.

Nesse ano, tivemos em algumas regiões do país o retorno das aulas presenciais, porém, não são todos os alunos que retornaram. “Não pode ir mais do que 35% nas escolas, e a Empresa de Desenvolvimento Urbano e Social de Sorocaba (URBES) exigiu que não passasse de 60% nas vans, utilizando máscaras e com os bancos separados”, diz Marcella.

Durante esse processo de volta as aulas presenciais, a realidade é  que nem todas as escolas tiveram ensino remoto, pois apenas com uma boa estrutura, internet e planejamento é possível ter aula online. Rodrigo Ratier, professor da Faculdade Cásper Líbero, com doutorado em educação, ressalta que nem toda escola pública possuí internet, e se tem, é para uso da secretaria e acaba sendo fraca: “Precisa investir, e esse investimento na rede pública não está sendo feito”.

“A escola não é o enfoque da covid-19, quando se tem 2 casos por exemplo, onde essa galera pegou covid? Nos transportes públicos”, diz Rodrigo, que sugere uma alternativa: “Dar subsídios para o deslocamento individual”.

“Tem muitas crianças e jovens sendo internados pela Covid-19 esse ano, mais do que no ano passado”, constata a bióloga e professora universitária Márcia Aparecida Sperança. “Não permito a ida de meus alunos para a universidade”, disse Márcia. A bióloga explica também que 50% dos seus alunos tiveram uma perda familiar e devido a situação, não sabe a maneira que eles retornariam.

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Marcela, que transportava cerca de 80 alunos, passou a ter 16 crianças para atender: “Nós trabalhamos com crianças especiais, e as mães desses alunos dependem do transporte”.  Porém em outros casos, pais e alunos se sentem inseguros ao terem que deixar o isolamento, fator que leva a diminuição de pessoas que buscam o serviço de transporte das vans.

Os pais acabam aproveitando o tempo do home office para levar e buscar seus filhos: “As vans escolares retiram do trânsito brasileiro milhões de carros individuais, e a interrupção deste serviço certamente causará nos grandes centros, um maior trânsito e engarrafamentos” diz o site da SEBRAE SP, e ainda com o toque de recolher, o trânsito em SP chegou a dobrar de tamanho de acordo com o G1.

Marcela relata que não teve ajuda do auxílio, e em prol dos condutores, a URBES não realizou a vistoria dos transportes neste ano. Além disso, o sindicato ofereceu 1 cesta básica para cada condutor. “Cruel, pessoas que precisavam do auxílio emergencial, não receberam”, se expressa Adalton, que contou que o governo deixou de dar 29 bilhões do pagamento do auxílio emergencial.

Marcela explica também, quanto ao processo de pagamento, que as crianças especiais que ela atende, possuem uma bolsa dada pelo governo, então o pagamento é feito por ele, diferente de outros condutores na qual o dinheiro é dado diretamente pelos pais dos alunos em particular. Dentre esse serviço de vans realizado, existem também aqueles que são contratados da prefeitura, no caso em São Paulo, motoristas que estavam sem trabalhar foram direcionados para transportar corpos de vítimas da covid-19.

Em uma constante dúvida e aguardando a normalização no serviço, Marcela diz que não tem a intenção de voltar a dirigir vans, pretende deixar o marido cuidando dessa parte e irá focar no Tô Fit. “Nunca fui cozinheira, é uma oportunidade que Deus me deu, de janeiro até agora a empresa só tem crescido”.

“É um momento que consigo conciliar com meus filhos”, mãe de 3 crianças, Marcela se sente mais próxima dos filhos, e brinca que durante o acompanhamento do ensino remoto, eles falam: “mãe se dessa vez não der para pagar a internet, não tem problema, a gente não vai ficar triste”, só para não terem aula online.

“Nesse processo, o que levo é que o meu sustento vem de Deus, aprendi a valorizar a família, a saúde, valorizar as pessoas em si” concluí Marcela, que no meio do caos encontrou uma luz no fim do túnel.

* Redação Aberta é um projeto destinado a apresentar o jornalismo na prática a estudantes do ensino médio e vestibulandos. A iniciativa inclui duas semanas de oficinas teóricas e práticas sobre a profissão. A primeira edição ocorreu entre 17 e 28 de maio. O texto que você acabou de ler foi escrito por um dos participantes, sob a supervisão dos monitores do núcleo editorial e de professores de jornalismo da Cásper Líbero.

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