Conectados pelo artesanato e espaço de trabalho, Geraldo Gonçalves e Jesus Urbaez relatam suas diferentes vivências na mesma avenida
Na mesma medida que é espaço de passagem, a Avenida Paulista também é local de trabalho para uma miríade de paulistanos. Para além dos conjuntos executivos da via, muitos trabalhadores se valem das calçadas para tirar o sustento do dia a dia. Dos vários ofícios presentes na Avenida, duas atividades se destacam: o comércio ambulante e o artesanato. ESQUINAS conversou com Geraldo Gonçalves, o GG, e Jesus Urbaez, dois artesãos já consolidados da região, e buscou entender como é viver de arte na Paulista.
Ateliê a céu aberto
Ao lado do MASP, GG, como se apresenta, esculpe na madeira a figura de Nossa Senhora. O escultor vive e trabalha na esquina da Avenida Paulista com a Rua Professor Otávio Mendes, onde montou sua barraca azul. Escultor há cerca de duas décadas, Geraldo Gonçalves tem a Paulista como lar e local de trabalho há cinco anos.
Através de sua intervenção manual, toras de madeira são transformadas em peças artísticas. Entrevistado por ESQUINAS, comentou seu vínculo com o espaço que habita: “Foi por intermédio da escultura e aqui na Paulista que eu pude descobrir quem eu era e entender o meu processo, além da minha verdadeira missão.”.
Enquanto trabalha, muitos dos que passam pela calçada param para observar algumas de suas obras, exibidas sobre um tronco. Ao ser questionado sobre o que acha mais especial da Paulista, prontamente fala das pessoas e o quanto aprende com elas, num lugar onde, segundo ele, muita coisa acontece. “Quando caí nesse lugar, pensei que era o fundo do poço, até que de repente, fazendo minha escultura, a luz começou a brilhar e agora sou um escultor na Paulista, todo mundo me conhece.” Geraldo conta que a avenida é preenchida de pessoas que o inspiram e o motivam.
Há 20 anos, GG utiliza suas próprias ferramentas e, geralmente, compra sua matéria prima. Por vezes, tem a sorte de encontrá-las, como é o caso dos troncos ao seu lado nas imagens. Ele conta que cortaram algumas toras de madeira e correu para pedir. Por mais que os empregados da obra tenham sido resistentes em cedê-las, conseguiu.
Ao ser perguntado sobre suas perspectivas de futuro, Geraldo revela que, apesar de sua vontade de expandir e direcionar seu trabalho a um ateliê, não se sente triste e agradece a oportunidade de estar num lugar como a Paulista.
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Refúgio na avenida
Ao lado do Shopping Cidade São Paulo, o venezuelano Jesus Urbaez comercializa artesanato feito com fibra de Buriti por membros da comunidade indígena Warao em seu país de origem. Distante da família, que permanece em nosso país vizinho, Jesus tem a Paulista como seu local de trabalho há oito meses. Como muitos imigrantes da cidade de São Paulo, veio em busca de fontes de renda para garantir o sustento da família.
Dentre os artigos vendidos por ele, é possível encontrar redes, cestas e recipientes de diversos tamanhos e formatos. A confecção de certos produtos pode demandar até três meses de trabalho, fato que Jesus crê ser negligenciado por muitos, que reclamam dos preços cobrados.
Além do dinheiro proveniente da venda de artesanato, Jesus diz também aceitar doações de roupas e comida para enviar a seus parentes
Sobre o porquê de ter escolhido a Paulista como local de trabalho, Jesus afirma: “ [A Av. Paulista] é um ponto onde me deixam vender meu artesanato, onde se pode trabalhar. Em outros pontos a prefeitura não deixa (…) Aqui sempre passa muita gente, sempre está lotado. As pessoas vêm para cá e vão para lá. Agora estou conhecendo vocês.”
Ao comentar a situação política e econômica da Venezuela, o comerciante critica a repressão estatal a direitos como a liberdade de expressão e a precariedade das condições salariais. Apesar das dificuldades ainda persistentes, Jesus encontrou refúgio na metrópole paulista: “Agora, a coisa está meio difícil para todos, mas aqui fica melhor do que em outro lugar.”