"Se manter 'limpo' na clínica é fácil, o problema é o dia a dia fora", diz ex-dependente química - Revista Esquinas

“Se manter ‘limpo’ na clínica é fácil, o problema é o dia a dia fora”, diz ex-dependente química

Por João Petrasso, Lucas Marra, Maria Eduarda Orleans e Renan de Oliveira Pagani : junho 13, 2024

Segundo Talia, o ideal é sair da internação e procurar um acompanhamento psicológico autônomo. Foto: Reprodução/Pexels

Segundo a OMS, em média, 6% dos brasileiros faz uso de algum tipo de droga, essa porcentagem caracteriza mais de 12 milhões de pessoas

A influencer Talia Hersegel, de 25 anos, ficou em tratamento de sua dependência química durante seis meses. “É doloroso, pois quando nos vemos sóbrios, temos a verdadeira consciência dos nossos atos, já que sobrevivíamos para usar e usávamos para sobreviver. Há uma linha tênue entre se encontrar e não se reconhecer. A minha pesonalidade era idealizada através do uso “, comenta. Talia se enquadrava como adicta – pessoa que demonstra receio de perder a chance de consumir a droga que lhe causou dependência. A adicção é uma doença química, física e psicológica.

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Pode ocorrer significativas mudanças corporais, como a alteração no metabolismo orgânico quando se interrompe o uso da droga.
Foto: Reprodução/Pexels

A primeira se manifesta por meio de uma reação no organismo, já a segunda são as significativas mudanças corporais, como a alteração no metabolismo orgânico quando se interrompe o uso da droga e, por fim, a terceira, que é a satisfação e o impulso psíquico provocado pela droga. De acordo com a OMS (Organização Mundial da Saúde), a dependência configura-se pelo uso descontrolado de substâncias tóxicas, sejam estas lícitas ou ilícitas, que podem alterar o estado mental do indivíduo.

Tratamentos droga

“Há um limite, eu não aguentava mais não ter o controle da minha vida. Aceitei que tinha um problema com as drogas e procurei ajuda”, relembra Talia, que fez todo o tratamento em clínicas particulares. A internação pode acontecer de três formas, a voluntária, que é o caso da influencer, onde o indivíduo reconhece a depedência e recorre ao tratamento; a involuntária, que não há a necessidade de consentimento da pessoa e ocorre por conta de terceiros – geralmente familiares -; e a compulsória, que é determinada pela Justiça.

A rotina de Talia na clínica se baseava em acordar às 7h e dormir às 20h, ou como ela prefere: “voltar a ficar trancada em uma casa durante onze horas seguidas”. Pela manhã formavam-se duas filas, uma para a dose de café e outra para o maço de cigarro – é costume das clínicas liberarem um agrado por dia. Em seguida ocorre a laborterapia, que é a limpeza de todo o espaço (salas, quartos, corredores, banheiros, entre outros lugares).

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A dependência química pode impactar no âmbito físico, psicológico e mental do indivíduo.
Foto: Reprodução/Pexels

Após a faxina surge outra coluna de pessoas, agora para os medicamentos. Entre uma tarefa e outra acontece um descanso, além de reuniões com terapeutas, psicólogos e psquiatras. “As duas clínicas que fiquei tinham nutricionistas e exercícios físicos. Mas em seis meses de tratamento consigo contar nos dedos quantas consultas eu tive. É algo que me revoltou, há muita negligência”, afirma Talia. Posteriormente ao tratamento, a influencer não retornou com o uso de drogas, mas também não acredita que as clínicas de reablitação são a melhor solução. “Se manter ‘limpo’ na clínica é fácil, o problema é o dia a dia fora”. Segundo Talia, o ideal é sair da internação e procurar um acompanhamento psicológico autônomo.

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Clínicas de reabilitação

No Brasil, o SUS (Sistema Único de Saúde) oferece gratuitamente os serviços e a inscrição pode ser feita pelo site do Sistema. Em paralelo ao SUS, há o Hospital Penteado, que é uma clínica pública focada em tratamento de dependentes químicos. “Nos vejo como uma escola, pois a avaliação do paciente é realizada por uma equipe multidisciplinar – terapeutas, psicólogos, médicos, clínicos-gerais e equipe de segurança”, comenta Luciana Penteado, fundadora do espaço em Ribeirão Preto. “Estamos com dificuldade para manter a estrutura por falta de apoio financeiro. Por sermos uma ONG sem fins lucrativos, não recebemos verba há 25 anos. Já tentamos de tudo com o poder público, mas a prefeitura de Ribeirão ignora os nossos pedidos”, completa.

Editado por Ronaldo Saez

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