Indústria de jogos no Brasil cresce com jovens produtores e estúdios independentes - Revista Esquinas

Indústria de jogos no Brasil cresce com jovens produtores e estúdios independentes

Por Eduarda Lessa, Francisco Prates, Guilherme Hiroki e Lucas Massei : novembro 5, 2024

Setor de jogos digitais movimenta R$13 bilhões no Brasil. Foto: Reprodução/ Pexels

BGS 2024 reforça espaço de jogos brasileiros no mercado, mas ainda enfrentam desafios relacionados a representatividade

Quem nunca almejou trabalhar na área dos sonhos? Ou até mesmo fazer do seu hobby, uma profissão? Maxsuel Santana também compartilhava esses desejos.Apaixonado por videogames, ele é um dos muitos jovens que buscam um curso de produção de jogos, área que está em ascensão no Brasil. Hoje, Maxsuel é estudante do Senac de São Paulo e desenvolvedor da Gap Studio.

“Eu vi a faculdade de games e pensei: sempre gostei de desenhar e games, então é aqui que eu vou ficar!”

Disse o estudante, bastante animado, em frente ao estande do Senac, onde apresentava demonstrações de seus jogos durante a Brasil Game Show (BGS) 2024.

Coordenadora do bacharelado em jogos digitais no Senac, Giovanna Saggiomo, relata um crescimento constante na procura pelo curso. E  ressalta como os estudantes chegam interessados nos elementos e disciplinas da formação. Entre estudantes e desenvolvedores que já fundaram seus próprios estúdios independentes, os indies, como são chamados na indústria, disponibilizaram cerca de 90 jogos brasileiros para teste durante a 15ª edição da BGS.

Marcelo Herzog, diretor-executivo do estúdio capixaba Mito Games, apresenta o jogo “Tupi: The Legend of Arariboia” como um dos representantes da nova onda que visa difundir elementos culturais brasileiros por meio dos jogos.

Estande a Mito Games na BGS 2024, empresa responsável pelo jogo Tupi: The Legend of Arariboia. Foto: Reprodução/LinkedIn Mito Games
Foto: Reprodução/LinkedIn Mito Games.

O estúdio adapta a história real do líder indígena do século XVI, Arariboia. Marcelo cita como outros países se afirmam internacionalmente ao divulgar suas identidades por meio de obras audiovisuais, lembrando das fundações de Hollywood nos Estados Unidos.

“Eu vejo desenvolvedores brasileiros fazendo jogos com temáticas de mitologia nórdica e egípcia, sendo que nós temos uma cultura imensa”, confessa o diretor.

Mesmo em meio ao momento de felicidade de quem pôde levar suas criações a uma feira de alta visibilidade como a BGS, os desenvolvedores não deixam de lembrar das dificuldades de suas atividades no Brasil. A busca pelo raro financiamento e a necessidade de dispensar equipes inteiras quando se encerra um projeto são experiências compartilhadas por muitas das empresas presentes.

Numa indústria que busca seu espaço e reconhecimento como atividade séria e até mesmo artística, ainda há personagens nem sempre validados. Segundo a Pesquisa Game Brasil (PGB) 2024, as mulheres representam a maioria do público (50,9%) que joga algum tipo de jogo digital no panorama nacional.

Quando se olha para aqueles que trabalham no setor, as mulheres representam somente 24,3% desta parcela, conforme dados da Pesquisa da Indústria Brasileira de Games 2023, feita pela Abragames. O dado é ainda menor quando se diz respeito à participação feminina entre sócias das empresas: 14,3%.

Gabriela Nacaratto e Stephanie Assunção, estudantes do 4º semestre do bacharelado em jogos digitais do Senac, contam como, por muito tempo, não sabiam da existência de cursos de graduação voltados aos jogos ou mesmo da possibilidade de trabalhar com isso.

Porém, a vontade de exercer em uma área que mesclasse arte e tecnologia levou ambas ao curso de jogos. Após a chegada no curso que desejavam, um receio seguia vivo para as duas: a falta de outras mulheres na turma.

“Foi uma surpresa, tinham várias outras mulheres na sala. Mesmo que a maioria ainda seja masculina, temos muitas mulheres e muito interessadas no curso, o que é muito legal”, contam as universitárias, trocando sorrisos.

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Giovanna Nacaratto, à esquerda, e Stephanie Assunção, à direita,  apresentam jogos desenvolvidos em game jams e projetos semestrais de seu curso de graduação. Foto: Francisco Camargo
Foto: Francisco Camargo .

Tanto as alunas quanto a coordenadora do curso,  relacionam a chegada das mulheres à indústria de jogos com avanços no setor. A diminuição de peças publicitárias que conversam somente com o público masculino e uma visão mais ampla durante o desenvolvimento é evidente, agora com traços que passavam despercebidos em equipes menos diversas.

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O crescimento do setor de games tem conquistado espaço na agenda econômica e gerado interesse por parte de instituições governamentais. Conforme a consultoria NewZoo, este setor movimentou, no Brasil, cerca de 13 bilhões de reais em 2023.

Em entrevista a ESQUINAS, Michael Cerqueira, diretor de investimentos e novos negócios da SP Negócios – agência de promoção de investimentos ligada à Prefeitura de São Paulo – comenta as ações públicas voltadas ao setor.

“A indústria do game não é só entretenimento ou uma forma lúdica; ela é uma ferramenta de inserção social e também de geração de negócios”, disse o diretor em uma sala de reunião no grande estande da agência durante outra feira de jogos, a gamescom latam. “Percebendo isso, a função da agência é entender o ambiente de negócios desse setor na cidade de São Paulo e como pode potencializá-lo. Hoje, são quase doze programas voltados aos games, tanto em financiamento quanto em capacitação e inserção no mercado.”

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Estande da Prefeitura de São Paulo na Gamescom Latam. Foto: Lucas Massei.
Foto: Lucas Massei.

Diversos programas de editais existem hoje no Brasil em diferentes níveis: municipal, estadual e federal. Agências como a ADE SAMPA e a Spcine, por exemplo, promovem programas de fomento nos quais os desenvolvedores concorrem por até 50 mil reais de investimento no desenvolvimento de seus jogos, além do acesso à programas de capacitação.

A existência dos editais, ainda que amplamente comemorada pelos desenvolvedores brasileiros, foi criticada por alguns concorrentes em conversa a ESQUINAS devido ao seu baixo valor. Devido ao pouco dinheiro inserido em cada projeto, muitas vezes os desenvolvedores têm que bancar de forma própria os jogos após encerramento do investimento do edital. O baixo número de vagas desses programas também gera preocupações, já que a indústria tem crescido em número de desenvolvedores mas as vagas de editais não.

Léo Motta, de 27 anos, é desenvolvedor da empresa Mad Mimic, que contava com um estande na área indie da Brasil Game Show. Léo destacou a importância dos editais para os desenvolvedores brasileiros:

“eles ajudam muito a gente, trazendo um investimento que pouco se vê na indústria brasileira. Apesar de que, nos últimos anos, tenha melhorado um pouco, o Brasil ainda é pouco competitivo comparado com o cenário global”.

Para Léo, feiras como a Brasil Game Show e a Gamescom Latam também são oportunidades importantes para o grande público conhecer os jogos nacionais e para a promoção de conexões entre os desenvolvedores.

Representando a categoria dos jogos educacionais, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) também esteve presente na BGS. Marcelo de Vasconcellos, pesquisador e professor permanente do Programa de Pós-Graduação em Divulgação da Ciência, Tecnologia e Saúde da instituição, destaca a produção interna de jogos na fundação voltados à divulgação científica, prevenção de doenças e melhorias no bem-estar social.

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Equipe da Fiocruz presente na Brasil Game Show divulgando sua produção interna de jogos Foto: Reprodução/Fiocruz-PE.
Foto: Reprodução/Fiocruz-PE.

O jogo SuperSUS, lançado em 2021, estimula o reconhecimento da importância do sistema de saúde, assim como a disseminação dos direitos à saúde de todos os cidadãos. Marcelo aborda a filosofia da instituição com os jogos:

“A gente quer jogos que sejam divertidos, interessantes e que demonstrem como os jogos podem ser vias extremamente legítimas para se aprender sobre o mundo, a saúde e a ciência”.

Editado por Bruna Blanco

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