O que a dupla Joel & Ellie e Hopper & Eleven tem em comum?

O que a dupla Joel & Ellie e Hopper & Eleven tem em comum?

Por Enzo Rocha Santos  : julho 21, 2025

Foto: Divulgação/Netflix e Reprodução - Revista Quem

Entenda como as duplas centrais de The Last of Us e Stranger Things se conectam em um cenário conturbado e conquistam fãs pelo mundo

Em meio a mundos pós-apocalípticos e ameaças sobrenaturais, duas duplas conquistaram o coração do público com suas jornadas de sobrevivência e afeto: Joel & Ellie, de The Last of Us, e Hopper & Eleven, de Stranger Things. Apesar de pertencerem a universos distintos, os laços entre essas histórias vão além da coincidência. Ambas exploram a relação entre figuras paternas marcadas pela perda de uma filha e duas  jovens que nasceram sofrendo pela ausência familiar. E mais: os criadores de Stranger Things já admitiram que a aclamada franquia da Naughty Dog, desenvolvedora responsável por criar The Last of Us, influenciou diretamente o tom e a estética da série.

A conexão inesperada entre os personagens principais

Eleven de Stranger Things e Ellie de The Last of Us compartilham um destino peculiar: ambas cresceram sem conhecer seus pais biológicos. Mais tarde, suas vidas se entrelaçam com figuras masculinas que, inicialmente, tinham apenas a missão de protegê-las. Tanto Joel quanto Jim (Hopper) carregam a dor da perda de suas próprias filhas, o que os leva a assumir a responsabilidade e o papel de pais para essas jovens.

A influência do jogo na série é inegável, e os próprios criadores de Stranger Things confirmam isso. Em 2016, antes mesmo da segunda temporada, os Irmãos Duffer (Matt e Ross) revelaram em uma entrevista à IGN o quanto admiravam o jogo: “Eu amo esse jogo, a sua narrativa e as suas imagens”, disse Matt Duffer. Ele completa:

Apenas sei que jogamos e temos sempre jogado vários games, então sinto que muitos se infiltraram na série.

Ellie Williams e Eleven Hopper são garotas que, desde a infância, enfrentam realidades extremamente desafiadoras, seja em um mundo pós-apocalíptico ou em meio a eventos sobrenaturais sombrios. Embora suas histórias sejam de ficção, a forma como elas lidam com seus desafios cria momentos envolventes para os fãs. É impossível não sentir empatia por essas protagonistas, que se conectam com o público de maneira sensível e tocante. Pequenos detalhes, como as piadas que contam depois de um conflito ou a inconfundível paixão de Eleven por waffles, revelam sutilmente a essência de cada uma, tornando-as personagens inesquecíveis.

Ellie com seu livro de piadas
(Foto: Reprodução/HBO)
Foto: Reprodução/HBO

Millie Bobby Brown em cena da primeira temporada de Stranger Things interpreta Eleven – (Foto: Divulgação/Netflix)
Foto: Divulgação/Netflix

Já Joel Miller e Jim Hopper, compartilham semelhanças notáveis, principalmente em seus papeis como figuras paternas adotivas com um jeitão carrancudo. Ambos são conhecidos por suas personalidades fortes e por um modo muito particular de proteger e cuidar daqueles que amam. Sobre essa conexão, Lucas Tinoco, crítico de cinema do Cine R7, comenta:

Há muitos paralelos entre eles, afinal, se tratam de convenções paternas nas mídias. Aqueles homens quebrados que possuem um mastro a ser protegido, sendo esse mastro suas filhas. É a representação da paternidade em tela e as protagonistas que querem descobrir o mundo, mas são inocentes.

A respeito do pilar semelhante que sustenta as obras, Victor Russo, crítico de cinema da Abraccine, adiciona

O sucesso das duas produções é marcado pela dupla de protagonistas, ainda que a série [Stranger Things] tenha um universo mais amplo. Já essa relação parental é a base do jogo.

Hopper e Eleven (Foto: Divulgação/Netflix)
Foto: Divulgação/Netflix

Joel e Ellie na cápsula de foguete em The Last of Us — (Foto: Reprodução/Youtube)
Foto: Reprodução/Youtube

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O impacto da perda nas duplas

Uma questão determinante nas personalidades e nas nuances de Hopper e Joel é a presença do trauma. Ambos perdem suas filhas biológicas de forma trágica, prematura e injusta. Da mesma forma, Eleven e Ellie, desde o princípio de suas vidas, são separadas de suas origens e constantemente pressionadas a serem algum tipo de salvação ou solução. Após a consolidação das duplas e sua aproximação, todos são confrontados a lidar e superar suas questões mal resolvidas.

A respeito dos impactos psicológicos oriundos de traumas, o psicólogo Luiz França destaca características que compõem parte das convergências entre as personagens:

São comuns a curto prazo sintomas de estresse agudo, como flashbacks, pesadelos e hipervigilância. Já a longo prazo pode haver o desenvolvimento de transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), além de crenças disfuncionais sobre si e o mundo (como, ‘sou fraco’ ou ‘as pessoas são perigosas’).

A dificuldade em se “abrir” emocionalmente é um reflexo presente em ambos os lados: tanto por parte do “pai protetor” quanto pela “filha rebelde” das histórias. O atrito e o desgaste baseados em mentiras contadas pela figura paterna – feitas com a intenção de proteger – e a ávida indignação por parte das jovens — que se sentem realmente traídas — são outros pontos em comum.

Luiz França complementa: “O trauma pode levar a reações como a desconfiança excessiva, evitação de intimidade emocional e dificuldade em pedir ajuda ou estabelecer vínculos seguros. A pessoa traumatizada pode perder a confiança em si mesma, duvidando de sua capacidade de julgamento ou valor pessoal e/ou perder a confiança nos outros, vendo o mundo como um lugar perigoso e as pessoas, como ameaçadoras.”

Joel e Ellie – (Foto: Reprodução – PlayStation)
Foto: Reprodução - PlayStation

Xerife Jim Hopper e Eleven em ‘Stranger Things’ – (Foto: Divulgação/Netflix)
Foto: Divulgação/Netflix

Em entrevista, João Cockell, fã das séries, comenta:

Ao longo das obras, Hopper e Joel desenvolvem um sentimento de cuidado, afeto e carinho com Eleven e com Ellie, respectivamente. Uma relação de pai e filha é criada, apesar de não terem essa ligação ‘natural’. Já Eleven e Ellie são personagens que passam por altos e baixos: momentos de descobrimento, amadurecimento, e momentos em que os sentimentos falam mais alto. Então, apesar de serem personagens com histórias diferentes, elas se assemelham nesse aspecto.

O que torna essas duas produções tão amadas pelo público é justamente essa dinâmica. Lucas Tinoco categoriza:

A narrativa se revela na interação dessas duplas. As pessoas não assistem The Last of Us ou o jogam, ou assistem Stranger Things pelos zumbis e pelo paranormal. As pessoas acompanham e consomem tais obras pela relação e beleza da própria com essas figuras paternas e as protegidas.

Victor Russo complementa: “Elas se apoiam bastante na relação ‘escolhido e protetor do escolhido’, com a diferença aqui no protagonismo feminino, algo raro para esses personagens dotados de um dom especial capaz de salvar ou destruir o planeta, fortalecendo assim o papel do protetor ‘pai de menina’, que deseja protegê-la, mas antes precisa tentar compreendê-la.”

Essas duplas se espelham em suas essências, mas conseguem, simultaneamente, manter suas próprias particularidades, complementando de forma extraordinária suas respectivas narrativas.

Joel e Ellie – (Foto: Divulgação/HBO)
Foto: Divulgação/HBO

Hopper e Eleven – (Foto: Reprodução/Netflix)
Foto: Reprodução/Netflix

Com isso, fica evidente que, embora The Last of Us, o aclamado jogo da PlayStation lançado em 2013 e adaptado para série pela HBO em 2023, e Stranger Things, a série de sucesso da Netflix criada pelos Irmãos Duffer em 2016, sejam obras distintas em seus universos, elas convergem de maneira notável na construção de suas narrativas e personagens. A conexão entre suas duplas protagonistas, forjada a partir de traumas e na busca por uma nova forma de família, é o elo que realmente ressoa com o público.

Enquanto aguardamos a quinta e última temporada de Stranger Things, prevista para 26 de novembro de 2025, e o futuro da terceira temporada de The Last of Us.

Editado por Giovanna Moretti

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