Recém-aprovados na USP contam como é entrar na universidade em tempos de isolamento
“Quando eu vi meu nome na lista, comecei a chorar e tremer. Senti muita felicidade, a nível extremo, mas também uma sensação de alívio. Eu estudei e valeu a pena”, conta Bruna Rocha Canuto, de 17 anos, sobre o momento em que descobriu que havia passado em Direito na Universidade de São Paulo (USP). Como muitos vestibulandos na pandemia, ela aguardava apreensiva a lista de aprovados: “Eu não consegui dormir algumas noites, ficava o tempo todo pensando sobre o assunto, e toda hora entrava no site para ver se eles não tinham liberado o resultado antes”.
Por um lado, Bruna acreditava que, independente do resultado, havia dado o seu melhor. Por outro, pensava que não iria passar, e que teria que estudar mais um ano para fazer a prova novamente, em mais um ano de incerteza em meio à pandemia.
Apesar dos riscos impostos pela covid-19, a Fuvest, responsável pelo maior vestibular do País, o da USP, ocorreu presencialmente. A prova, que deveria acontecer em novembro de 2020, foi adiada para janeiro de 2021, quando mais de 113 mil candidatos participaram da primeira etapa do vestibular.
Breno Faccio, aprovado em 4º lugar em engenharia na USP de São Carlos, conta quais foram as medidas sanitárias adotadas: “As salas tinham 40% de ocupação, as cadeiras estavam a um metro e meio de distância e os monitores davam álcool e panos para quem quisesse. Podia beber água, mas, para comer, tinha que sair da sala. Foi uma experiência diferente fazer uma prova de cinco horas com máscara.”
Vestibulanda na pandemia
A migração do estudo para as casas atrapalhou muitos vestibulandos, mas não Isabela Nardo. A estudante de 17 anos foi a primeira colocada na Faculdade de Medicina da USP, em Ribeirão Preto. Segundo ela, como estava em casa, não perdia tempo de deslocamento de ida e volta ao cursinho, e, assim, acabou estendendo ainda mais seus estudos, que iam das 14 às 20h.
“Depois [de estudar], tomava banho, jantava e estudava mais uma hora e meia antes de ir dormir”, conta. A fim de driblar o impacto da quarentena, Isabela estudava em cômodos diferentes para não enjoar e colocava o celular bem longe para se concentrar.
Ainda no colegial, ela conciliava os estudos com a vida social, mas, com a pandemia, isso não era mais necessário. “Eu fiquei só um mês no cursinho presencial, e nesse momento inicial a gente normalmente fica muito sério e focado, então não acabei saindo. Mas no terceiro colegial eu equilibrava, ia às festas, participava dos eventos da escola. No ano passado, por conta da pandemia, não tivemos escolha porque não podia sair, mas num mundo hipotético em que não houvesse a quarentena, eu com certeza tentaria me equilibrar’’.
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A trajetória em busca da aprovação não é fácil, Isabela indica disciplina, horários regrados de estudo e, se possível, terapia para manter a saúde mental. “É um processo que leva tempo, tem que ter calma, paciência. É difícil para qualquer vestibulando, não só os de medicina”.
Como o sonho de ser médica não é de hoje, não faltou motivação: “Desde os meus 10 anos já brincava de médico, aquelas brincadeirinhas de consultório, eu até inventava instrumentos, lembra”. Desde o 9º ano do ensino fundamental, já estava com profissão e universidade escolhidas: medicina na USP em Ribeirão Preto.
Passei! E agora com a pandemia?
Em tempos normais, depois de ingressar na faculdade, os calouros esperavam ansiosos as festas e trotes dos veteranos. Com a pandemia, o mundo universitário decepciona os bixos, especialmente em São Carlos, cidade do interior de São Paulo conhecida por suas festas e jogos universitários, como o Tusca.
Breno, recém-aprovado em engenharia, se divide entre a saudade do que ainda não viveu e a ansiedade por estar, mesmo que remotamente, em ambiente universitário. “Ingressar numa faculdade de forma online estraga um pouco. A gente já pensa em república, festa, morar sozinho, mas em nenhum momento eu pensei em desistir da vaga por conta disso. O meu sonho de cursar engenharia é maior do que essas restrições”, afirma.
Nesse contexto, as atividades de recepção dos calouros vão acontecer, mas a distância: ‘’Eles vão fazer alguma dinâmica de jogos, brincadeiras, mas não comentaram sobre o que vai ser. Até agora é um mistério”.
São comuns os relatos de calouros com medo de não fazer amizades ou dificuldade de conhecer pessoas nesse ambiente. João Izabo Passetti, de 19 anos, vai ter que passar por isso duas vezes. Ele já havia iniciado as aulas de jornalismo na Faculdade Cásper Líbero quando foi aprovado em Relações Públicas na USP. “Cogitei fazer as duas faculdades ao mesmo tempo, mas não deixar de ir para a USP, que é um sonho desde que eu comecei o ensino médio. Mas achei que seria muita coisa para fazer, muito texto para ler”, conta.
João diz ter se surpreendido e feito mais amizades do que esperava: “Eu curti bastante o ínicio na Cásper, fiz várias amizades e isso é o que mais pesa nessa mudança. Eu já tinha um nicho de amigos, e agora vou ter criar outro, sem perder o da Cásper, obviamente”.