Jovens pilotos brasileiros relatam felicidade ao chegar na Fórmula 4, mas apontam dificuldades na transição - Revista Esquinas

Jovens pilotos brasileiros relatam felicidade ao chegar na Fórmula 4, mas apontam dificuldades na transição

Por Juliana Pissarra, aluna do Redação Aberta #4 : outubro 27, 2022

Foto: Clément Delacre

Em entrevista exclusiva, Luan Lopes e Aurelia Nobels comentam gratidão de fazerem parte da primeira turma da competição no Brasil, porém não deixam de citar as dificuldades na passagem entre categorias

Anunciada no começo de novembro de 2021, a Vicar, principal empresa do automobilismo brasileiro e promotora da Stock Car Pro Series, informou a realização da Fórmula 4 Brasil. A categoria é certificada pela Federação Internacional do Automóvel (FIA) e tem como objetivo preparar jovens pilotos para continuarem suas carreiras internacionalmente.

Uma grande diferença para quem chega do kart é que são usados os mesmos equipamentos que as outras Fórmulas 4 no mundo. Assim, busca-se dar aos kartistas a oportunidade de correr em alto nível, sem que eles precisem deixar o Brasil tão cedo — e suas famílias.

A pilota Aurelia Nobels, representante da equipe TMG Sports, filha de pais belgas e nascida nos EUA, começou sua jornada no kart há cinco anos, aos 10, no Speedland Kart Center. Foi influenciada pelo interesse que seu irmão tem no esporte. Com o auxílio de seus pais e do piloto já falecido Tuka Rocha, logo tratou de ir atrás de equipes e começou a competir em categorias de kart no Brasil. Posteriormente, participaria de competições na Europa.

Hoje, ela é a única mulher no grid da Fórmula 4 e é finalista do Girls On Track – Rising Stars. O torneio pode consagrá-la como a nova piloto da academia Ferrari. Em contrapartida, o paulista Luan Lopes, 17, teve seu primeiro contato com o kart aos seis anos de idade e começou a competir aos oito, por influência de seu pai, piloto da Copa Truck. Após alguns anos no kart, passou a competir na Copa HB20 e estreou na Fórmula 4, pela equipe KTF Sports, pouco tempo depois.

Os dois expressam alegria pela oportunidade de disputarem a Fórmula 4, mas enfrentam desafios. De acordo com Aurélia, a parte mais difícil nessa transição é ter domínio do novo estilo de carro: “É muito mais pesado e tem mais downforce. O freio é mais duro. Exige mais da parte física do que o kart”.

O downforce ao qual se refere é a força que faz o carro “grudar” no chão, dando aderência ao piloto nas curvas em alta velocidade. Ainda acrescenta que a disputa por posições na corrida de Fórmula 4 traz maiores dificuldades: “No kart, você pode jogar, bater um pouco, encostar que não acontece nada. É uma diferença muito grande”. Já na categoria em que está, qualquer batida pode resultar em acidentes e carros quebrados.

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A experiência de Luan se mostrou ainda mais desafiadora depois que saiu da categoria Turismo: “Eu pulei do kart para a Turismo. Para mim, foi tranquilo”. Mas Luan explica que devido à mudança de tração dianteira para traseira, a transição para a Fórmula 4 exige mais tempo de adaptação.

O piloto da KTF treina três vezes por semana, acompanhado de seu preparador físico, enquanto Aurélia faz seus treinos todos os dias no período da manhã. Ela conta que o horário escolar vai das 8h às 17h. No entanto, “essa semana estou faltando de manhã pra poder treinar na academia”, confessa a piloto da TMG que complementa: “treino todos os dias na academia e faço simulador”.

Os treinamentos ocupam tanto do seu tempo que a garota já considera se matricular em uma escola on-line, principalmente se vier a ganhar o Girls On Track. Uma eventual conquista do torneio poderá significar uma mudança entre países: do Brasil para a Itália.

Em muitos momentos, a vida de piloto pode parecer incompatível com a adolescência: “É complicado conciliar os treinos, a escola, a vida pessoal e profissional no automobilismo”, diz Luan. Ao menos, ele conta com a compreensão da instituição de ensino da qual faz parte: “Eles me apoiam em tudo. Se precisar remarcar alguma prova, estão dispostos a me ajudar”.

Aurélia também complementa com pontos positivos, ao dizer que sempre pôde viajar para competir em outros lugares, como na Europa, graças ao apoio recorrente de seus familiares. Além disso, a criação da categoria fez com que ela ficasse no Brasil — sem que precisasse buscar por oportunidades no exterior e estabelecer uma relação à distância com seus pais. Mesmo assim, a disputa por uma vaga na Ferrari pode forçá-la a perder a etapa de Goiânia.

Diante de inúmeros desafios, os jovens pilotos dizem amar a atividade. Dedicam-se desde já ao automobilismo com a motivação de quem o vê como um projeto de longo prazo. Também se demonstram realistas e cautelosos quando questionados sobre o futuro.

O plano é “ir com muita calma, passo a passo. Fazer mais um ano de Fórmula 4, depois a Fórmula 3, Fórmula 2 e Fórmula 1, se Deus quiser”, projeta Aurélia. Luan compartilha do mesmo sentimento da colega. Sobretudo, expõe sua vontade de “viver cada segundo da juventude junto da família e dos amigos”, reforçando a necessidade de ser jovem, ainda que a pressão por estabelecer uma carreira profissional já esteja presente desde cedo.

*Redação Aberta é um projeto destinado a apresentar o jornalismo na prática a estudantes do ensino médio e vestibulandos. A iniciativa inclui duas semanas de oficinas teóricas e práticas sobre a profissão. A segunda edição ocorreu entre 20 de setembro e 1 de outubro. O texto que você acabou de ler foi escrito por um dos participantes, sob a supervisão dos monitores do núcleo editorial e de professores de jornalismo da Cásper Líbero.

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