Espetáculo de dança inspirado no discurso estético de Rita Lee, paulistana que revolucionou o cenário musical brasileiro, chega à São Paulo
Homenagem boa se faz em vida. Idealizado pelas artistas baianas Ana Paula Bouzas e Jussara Setenta, o espetáculo inspirado em uma das mulheres mais importantes do cenário pop-rock brasileiro reúne todo o universo estético da singular Rita Lee. Marcado por inúmeras cores e personalidades, a produção estreou no dia 31 de março e ficará em cartaz até o próximo domingo (30), no Teatro Unimed, em São Paulo.
A idealização do espetáculo teve seu início há cerca de um ano, logo no primeiro semestre de 2022. “Fomos sondados pelo Teatro Unimed para fazer um espetáculo de dança que pudesse acontecer em janeiro de 2023,” compartilha Ana Paula Bouzas. “Queriam um trabalho de dança divertido, alegre, menos denso e que tivesse, de repente, alguma coisa a ver com São Paulo. A partir disso, surgiu a ideia de Rita Lee.” A diretora conta que a ideia foi muito bem aceita, entretanto, concluída apenas no segundo semestre. Portanto, o plano de estrear em janeiro deste ano não seria possível, mas o projeto foi mantido ainda assim. “Àquela altura estávamos ainda mais apaixonados pela Rita. Mais do que eu já era, desde criança, e Jussara também.”
“Assim que entendemos que o projeto seria inspirado no universo estético de Rita Lee, começamos uma pesquisa” afirma Ana Paula. “Lemos não somente a biografia, lemos outros livros da Rita, passamos a baixar links de show, entrevistas… Começamos a fazer um acervo de referências.” A complexidade da figura Rita Lee se mostra presente durante todo o espetáculo e comprova o cuidado por trás da produção de um projeto tão especial. O público é apresentado a coreografias que nos fazem navegar pela trajetória artística da cantora, passando pela fase como garota dos Mutantes, pelo seu casamento com o músico Roberto de Carvalho, seus atos “de rebeldia” em época de ditadura e muito mais.
Sobre a montagem, a diretora destaca a integração entre as diversas formas de expressão artística presentes no espetáculo, “a gente se propôs desde o início a fazer um trabalho de dança onde as áreas de criação se comunicassem, uma conversa bastante ativa entre a cenografia, o figurino, a trilha e a iluminação. Uma das coisas que nos chamou muita atenção nesse percurso de estudo sobre a Rita é a forma como ela conduzia os shows, como o olhar dela extrapolava a relação com a composição e com o canto.” Ana Paula resume a produção em cinco fundamentos: visualidade, feminilidade, ludicidade, criticidade e criatividade.
“Lá Vem Ela” retrata a irreverência e atitude da cantora paulista através de coreografias originais idealizadas pelas diretoras em conjunto das três dançarinas que compõem o elenco. Com seus corpos mutantes, Ana Brandão, Luana Fulô e Patricia Zarske dialogam com a criatividade das músicas e são capazes de nos transportar a um universo de psicodelia, contracultura e teatralidade característico da rainha do rock nacional. Para tanto, as dançarinas extravasam o deboche, humor, sensualidade, rebeldia e feminilidade em suas coreografias, aspectos cruciais na construção da imagem de Rita Lee enquanto artista símbolo de uma geração.
De forma livre e diversa, as dançarinas contestam valores estéticos e transformam restrições em produções criativas geradas por uma visão democraticamente humanitária e livremente feminina. Cada movimento corporal é ressignificado para invocar a personalidade de Rita no palco, o que é reforçado pela presença de figurinos com cores vibrantes e estética correspondente aos marcantes traços de personalidade da cantora, do comportamento pueril ao vanguardismo.
A música de Rita Lee ao longo do espetáculo
Embora não sejam tão claras em alguns momentos, devido à releitura proposta pela montagem do espetáculo, as referências sonoras são capazes de incorporar o ritmo da dança à discografia da artista, referenciando de forma sutil, frases melódicas instrumentais e vocais. Assinada por Jarbas Bittencourt e Ronei Jorge, a trilha sonora viaja por diversas camadas de desconstrução e mistura de sons, em nome da leveza, da crítica, da ironia e do bom humor da cantora. “Eu reparei na trilha sonora que tinha. Teve muita referência ao LP Saúde, ao de 1979 (álbum que leva o nome da cantora), tinha também a faixa “Chega Mais”, depois ouvi referências de “Pega Rapaz” (Flerte Fatal, em parceira com seu marido Roberto de Carvalho) e Lança Perfume” aponta Amadeu, fã da cantora que assistiu ao espetáculo na última sexta-feira (21).
Ana Paula ainda se emociona ao falar sobre o impacto da cantora paulista enquanto figura que atravessa gerações, “ela é uma profusão de criatividade, tanto que entra em contato com outras áreas, como a literatura. Vejo o espetáculo como uma declaração de amor, um ‘muito obrigado’ Rita, porque ela foi um farol para muita gente. Um ponto de soltura das amarras e mordaças para uma geração. Um farol apontando de maneira muito poética e também muito direta para o nosso caminhar como mulher.”
No início do mês passado, Rita anunciou sua nova autobiografia intitulada “Outra Autobiografia”. Focada nos últimos três anos de sua vida, essa edição trará maior destaque para sua recente e constante batalha contra um câncer de pulmão. Recentemente, os fãs da cantora ficaram preocupados após ela ter sido internada em um hospital de São Paulo. Felizmente, a Rita Lee já está recuperada e parece ter apenas passado por um episódio que faz parte da rotina de recuperação após o tratamento contra a doença. A diretora enfatiza que a estreia da produção apenas coincidiu com o enfoque atual na figura da artista.
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“Lá Vem Ela” ficará em cartaz até o próximo domingo (30), no Teatro Unimed. Nas sextas e sábados o espetáculo acontece às 20h e, aos domingos, às 18h. Os valores dos ingressos variam entre R$40 e R$100, podendo ser adquiridos tanto pela internet, no site do Teatro Unimed, quanto pelas bilheterias físicas do teatro.
Ficha técnica:
Idealização e direção artística: Ana Paula Bouzas e Jussara Setenta.
Coreografia: Ana Brandão, Ana Paula Bouzas, Jussara Setenta, Luana Fulô e Patricia Zarske.
Elenco: Ana Brandão, Luana Fulô e Patricia Zarske.
Trilha sonora: Jarbas Bittencourt e Ronei Jorge.
Figurino: Bettine Silveira.
Cenografia: Renata Mota.
Desenho de luz: Fábio Espírito Santo.
Produção: PLATÔproduções e Meimundo Inventações Compartilhadas.
Realização: Teatro Unimed, Alameda Santos, 2159 – Jd. Paulista, São Paulo – SP