Roberto Galvão, professor de música há mais de duas décadas, explica o que vem mudando na música popular brasileira e internacional
O mundo da música se divide em muitas categorias diferentes usando caraterísticas em comum para fazer as separações. Uma dessas divisões é o que se conhece como música pop, mas o que exatamente é isso?
Segundo o Dicionário Brasileiro de Língua Portuguesa Michaelis, pop é uma “criação artística ou cultural, de origem popular e veiculada nos meios de comunicação de massa”. Enquanto isso, a expressão “música pop” é definida por “música popular, geralmente direcionada a uma audiência jovem, que se caracteriza por pulsos rítmicos dançantes, pela repetição sonora e letra de fácil memorização. É uma música abrangente, que incorpora elementos que vão do rock ao rap”.
Apesar de bem diferentes, os tipos de música apresentam uma característica em comum: a constante mudança. O pop atual, por exemplo, não é o mesmo que o das décadas passadas. As mudanças são notadas observando o topo das paradas de cada época. Nos anos 60, o pop rock dominava os EUA, com The Beatles, The Rolling Stones, Elvis Presley, Jimi Hendrix, Bob Dylan, Janis Joplin e Eric Clapton.
Ao mesmo tempo, no Brasil, a bossa nova estava dando lugar à Tropicália e à Jovem Guarda. Os artistas integrantes da bossa nova, como João Gilberto e Tom Jobim, ainda eram presentes mesmo com o surgimento de nomes como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa, os Mutantes e Roberto Carlos.
Entretanto, agora, o cenário se mostra muito diferente. Analisando os artistas mais escutados no mundo, de 2010 até 2019, no Spotify, uma das principais plataformas de reprodução de músicas, percebe-se que os ritmos mais presentes são o rap e o pop. O rapper americano Drake lidera o ranking, seguido por Ed Sheeran, Post Malone, Ariana Grande e Eminem. No Brasil, há uma predominância do sertanejo e do pop. A dupla Jorge e Mateus lidera na lista de artistas mais tocados, seguidos por Marília Mendonça, Anitta e Matheus e Kauan nas próximas posições.
Novos estilos musicais?
O rock pode ser enquadrado na categoria do pop, porém, o que mudou para que o rap e o sertanejo estejam dominando?
Roberto Galvão, professor de música há mais de 20 anos, explica que, no âmbito da teoria, praticamente não houve mudança. Segundo ele, “o sertanejo não trabalha com acordes variados e complexos, nem o rock” e os dois têm características semelhantes.
O rap teve origem do hip-hop, que nasceu na Jamaica e se desenvolveu nos Estados Unidos. Assim como o rap, o funk surgiu a partir de outro estilo de música – na verdade, de outros estilos. O gênero musical veio da combinação de outros como blues, gospel, jazz e soul. Ou seja, esses estilos do pop vieram de outras vertentes.
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Mudanças na prática
Contudo, o professor, que também tem um conservatório, afirma que a ausência de mudanças teóricas não é algo para se comemorar. “Antes, era visada a criação, com o objetivo de você compor sua própria peça”, diz Roberto. Ele argumenta que a falta de novos ritmos no Brasil é muito prejudicial para a música e explica a situação. “Antigamente, todos os livros [de teoria musical] que entravam no Brasil passavam por uma vistoria. O livro passava por universidades, como a USP, e os professores avaliavam o teor do livro, se seria interessante ou não para o Brasil. Quando davam o aval, as editoras encomendavam lotes ou reproduziam. Mas isso acabou”.
Para ele, a abertura desse requisito e a entrada de livros de caráter moderno, vindos principalmente dos Estados Unidos, ocasionaram na perda de criatividade e independência dos estudantes de música e produtores pop, resultando na falta de novos ritmos dentro da área.
Roberto aponta que, na década de 50, a Jovem Guarda, inicialmente, fazia apenas cópias das ideias norte-americanas, ou seja, ocorria um problema parecido. Porém, o diferencial, segundo ele, é que começaram a surgir novas criações a partir das ideias de fora – nomes como Roberto Carlos, Erasmo Carlos e Wanderléa ilustram o caso.
Democratização da música
Entretanto, é possível afirmar que o setor musical está mais democrático, e essa é uma mudança prática. Tipos de música pop antes marginalizadas, como o funk e o rap, estão, agora, no topo das paradas – mesmo que ainda haja preconceito com os gêneros.
Atualmente, buscando inspiração dentro do próprio Brasil, artistas que estão há mais tempo na música vêm fazendo parcerias com novos nomes. Alguns bons exemplos são: Nando Reis, além de acompanhar as meninas do Anavitória em uma série de shows, lançou um EP em parceria com a dupla; Samuel Rosa, buscando atingir um público mais jovem, participou de uma música do cantor Vitor Kley; Ivete Sangalo, no mesmo intuito, colaborou com Jão.