Apesar de ser diagnosticada cada vez mais cedo entre jovens e crianças, esclerose múltipla ainda não é compreendida pela população
A adolescência é marcada por transições que pedem atenção especial. Pense em conviver durante esse período considerado complicado com uma doença rara, da qual você nunca ouviu falar. Essa é a realidade de muitos jovens que têm esclerose múltipla (EM), uma doença autoimune em que o próprio sistema de defesa do organismo ataca o sistema nervoso central, fragilizando a bainha de mielina, uma membrana que protege os neurônios. A jornalista Giulia Gamba, que descobriu a doença aos vinte, explica: “É como se o nosso cérebro fosse um telefone com fio, a bainha de mielina é o revestimento de plástico que protege a informação que está passando no meio e essa informação é a que os nossos neurônios passam para o resto do corpo”. Ela conta que seu sistema imunológico ataca essa proteção de plástico, interrompendo o fluxo de transmissão de informações.
A EM pode afetar diversas partes do corpo e os sintomas são fadiga, alterações fonoaudiológicas, transtornos visuais e problemas de equilíbrio e de coordenação motora. A EM é um diagnóstico que não tem cura e de causa desconhecida.
Segundo dados divulgados pelo Datafolha em 2017, 46% dos brasileiros não conhece a EM. Por isso, muitos têm dificuldade em compreender o diagnóstico. “Eu fiz a ressonância magnética, um dos exames mais importantes para o diagnóstico da esclerose, e o médico me explicou sobre a EM. Eu a associei com a ELA e entrei em choque”, conta Gamba. A ELA é a esclerose lateral amiotrófica, doença que enfraquece os músculos, afeta as atividades físicas e ficou conhecida por causa do físico Stephen Hawking. “Eu pensava: ‘estou no segundo ano da faculdade, começando agora a minha vida. Acabou para mim’”, completa.
Henrique Alves teve seu diagnóstico – que levou meses para ser conclusivo – aos 17 anos. “Viver com a EM na juventude se resume a matar um leão por dia, levantar a cabeça e seguir em frente”, desabafa. Tudo começou com problemas na visão. Óculos não ajudavam. Foi encaminhado para o neurologista e, após diversos exames e suspeitas de outras doenças, soube o que era. Mas ele só tinha uma noção superficial sobre o que era a esclerose múltipla.
Muitas vezes, quando os sintomas do paciente pioram, é necessária a internação. Na juventude, isso o afasta da sala de aula. É importante que a escola tenha preparo para lidar com esse aluno. “Muitas vezes, a escola não dá o apoio necessário”, critica Dra. Alice Estevo Dias, fonoaudióloga do Hospital das Clínicas e da Associação Brasileira de Esclerose Múltipla (Abem). Ela explica que uma das intervenções realizadas pela instituição, é levar uma assistente social a escolas para explicar o que é a EM e que os jovens podem ter uma alternativa para continuar estudando por meio de trabalhos e outros materiais enquanto estão no hospital.
A Abem presta assistência aos pacientes em diversas áreas e por meio de terapias de apoio. O objetivo é proporcionar uma qualidade de vida melhor a eles e a seus familiares. Para isso, a associação organiza atividades como coral, aulas de música e teatro e recebe ajuda do governo para a locomoção dos pacientes até a sede, na zona sul de São Paulo. O Atende é um transporte da Prefeitura de São Paulo que dá suporte aos que têm dificuldade de locomoção.
A Amigos Múltiplos pela Esclerose (AME) é uma organização que compartilha informações sobre a EM de forma gratuita e acessível. Ela criou o Agosto Laranja, mês voltado para a conscientização da doença. Durante esse período, acontecem eventos para que as pessoas conheçam a esclerose e saibam como diagnosticá-la, tratá-la e conviver com ela.
A demora de um diagnóstico preciso pode gerar sequelas e desconfortos como atrofiamento muscular, fadiga, formigamento no braço, neurite óptica e até mesmo paralisação de alguma parte do corpo. A falta de informação sobre a EM também dificulta a procura de um médico mediante os primeiros sintomas. Apesar de não haver cura, há métodos capazes de minimizar a doença, o que melhora a qualidade de vida dos pacientes. Receber o diagnóstico cedo, como aconteceu com Giulia Gamba e Henrique Alves, pode facilitar ainda mais esse tratamento.