O programa Trampo Justo busca dar oportunidades de emprego a jovens que moram em abrigos no estado de São Paulo
De segunda a sexta-feira, às 6h30, Larissa Borelli, de 15 anos, pega um ônibus em Cambuci até a Escola Estadual na Aclimação. Depois, vai para o Centro de São Paulo trabalhar como jovem aprendiz na empresa Tartus. “Faço um pouco de tudo, arrumo prateleira, edito foto e baixo boleto”, diz. Ela volta para casa apenas às 17h30. Há dez anos, ela e seus dois irmãos moram em um abrigo. Assim como Borelli, mais de 50 adolescentes no estado de São Paulo vão diariamente das casas de acolhimento até seus trabalhos conseguidos pelo projeto Trampo Justo, uma parceria entre o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP) e o Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE).
Se para muitos completar a maioridade é um ritual de passagem, para os adolescentes que moram em abrigos é um verdadeiro desafio. Segundo levantamento do TJ-SP, 50 jovens a cada mês completam 18 anos, e tem que sair casas de acolhimento no estado de São Paulo. Sabendo disso, o juiz Iberê Dias, assessor da Corregedoria Geral da Justiça, encabeçou o projeto Trampo Justo. “Lidamos com adolescentes de origem extremamente humilde, famílias disfuncionais, defasagens educacionais e, aos 18 anos, são jogados na rua e têm que se virar sozinhos. Pensamos em como desenvolver nesses adolescentes mecanismos de autonomia”, afirma Dias. O projeto, iniciado em fevereiro de 2019, já possui 1.100 jovens cadastrados.
Vinte e sete empresas, como a Magazine Luiza, o Sport Club Corinthians Paulista e a Universidade Nove de Julho, que fornece bolsas de estudo aos jovens, já se uniram a ele. Apesar da rede de parceiros, o gerente regional de São Paulo da CIEE, Luiz Douglas, afirma que é um desafio engajar as companhias. “Eles querem aquele jovem com experiência, idioma fluente, habilidades específicas. Precisamos mudar a cabeça das empresas para ajudar os adolescentes que estão em condições de vulnerabilidade, senão vamos perdê-los para a criminalidade”, explica.
Para o juiz Dias, a dificuldade maior está em sensibilizar os adolescentes a trabalhar e encontrar emprego honesto. “Quando você tem 14 anos, 18 anos parece uma eternidade, mas estamos falando de adolescentes de áreas periféricas que são constantemente assediados pelo tráfico”. Com isso em mente, Dias convidou o rapper Dexter – que passou 13 anos encarcerado – para conversar com os jovens das casas de acolhimento. “Por mais que eu faça o exercício de empatia, nunca vou imaginar como é estar na pele desses adolescentes e Dexter tem essa história de vida”, afirma Dias.
Em três anos, além de Larissa Borelli, 1800 jovens também atingirão a maioridade. O principal desafio deles será conseguir moradia e permanecer no mercado de trabalho. E, apesar de Borelli ter conseguido seu primeiro emprego como jovem aprendiz e gostar do que faz, o tempo segue correndo. No futuro, quer se especializar no cuidado de crianças e levar seus dois irmãos para morarem com ela. “Quero trabalhar com os pequenos, há várias profissões que possibilitam isso”, diz.