Brasil: sociedade autoritária e colonialismo interno - Revista Esquinas

Brasil: sociedade autoritária e colonialismo interno

Por Joana Salém Vasconcelos : julho 3, 2023

Esse dossiê contará até o final de julho com 23 reportagens produzidas por alunos do 3º ano de jornalismo da Cásper Líbero, dentro da disciplina de História do Brasil Contemporâneo. Dessa vez, os alunos estudaram os conceitos de sociedade autoritária (de Marilena Chauí) e de colonialismo interno (de Rodolfo Stavenhagen) para enxergar como se manifestam as violências estruturais nas situações cotidianas da realidade brasileira.

O conceito de sociedade autoritária tem enorme poder explicativo sobre o cotidiano brasileiro. Segundo Chauí, “temos o hábito de supor que o autoritarismo é um fenômeno político que periodicamente afeta o Estado, tendemos a não perceber que é a sociedade brasileira que é autoritária e que dela provêm as diversas manifestações do autoritarismo político”. As hierarquias sociais, raciais e de gênero atravessam todo o tecido social e o autoritarismo é constantemente naturalizado. A sociedade autoritária cria “mecanismos para tolerar várias formas de violência”, que são invisibilizadas e de longa duração. As relações privadas de mando e obediência são consagradas por uma cultura de tipo senhorial, que se replica também nas camadas médias. Uma divisão brutal entre trabalho manual e intelectual materializa e reproduz tais hierarquias. A repressão contra os mais vulneráveis é a norma, acompanhada da (já tradicional) culpabilização da vítima.

O conceito de colonialismo interno, por sua vez, acrescenta mais uma camada crítica à compreensão do Brasil. O roubo territorial dos povos tradicionais para a monocultura de exportação, a espoliação da natureza e a violência mortífera sobre povos que vivem outras epistemologias dentro do Brasil foram motores da colonização, mas estão longe de terminar. Ao contrário, o colonialismo se reinventa e acelera com modernização tecnológica e política. Para Stavenhagen, “as regiões subdesenvolvidas de nossos países fazem às vezes de colônias internas” e o progresso técnico aplicado a estruturas sociais desiguais só aprofunda nossos atrasos. O avanço do agronegócio que desmata a floresta e viola direitos indígenas em pleno século XXI torna esse colonialismo interno quase óbvio. Mas não é só na fronteira agrícola que ele é visível. Também na hierarquia entre regiões do Brasil, na xenofobia contra nordestinos, no trabalho análogo à escravização para produzir espumantes para classe média, no algoritmo dos aplicativos “acelerando” a exploração do trabalho nas grandes cidades.

Após aulas de discussões e conceituações destes tópicos, os alunos produziram matérias sobre diversos acontecimentos relevantes da atualidade brasileira. São eventos jornalísticos compreendidos de maneira histórica, antropológica e sociológica por meio destas duas categorias.

Neste dossiê, são reunidas análises críticas sobre o Marco Temporal, narrativas sobre a vida dos entregadores e motoristas de aplicativo, debates sobre o trabalho doméstico e a violência de tipo intimista, casos de racismo recreativo na universidade, assédio moral nas grandes empresas, escravização de pessoas e programas de resgate, a extrema direita, o narcogarimpo e o armamentismo entre outros.

Boa leitura!

Como o Bolsonarismo incita a xenofobia perante o voto nordestino

O marco temporal: um projeto parado no tempo

“Nossos direitos já vêm sendo violados ao longo dos séculos”: coletivos indígenas e a luta política

Desafios do combate ao trabalho escravo na contemporaneidade

O narcogarimpo em números: como o crime organizado atua nas Terras Yanomami

Movimento luta para humanizar paulistanos postos às margens do capitalismo

Povos indígenas: progresso para poucos

Ouro de Tolo: entrada e saída do garimpo ilegal nas terras indígenas

Casos de violência contra trabalhadores de aplicativo acendem alerta sobre preconceito e irregularidades

O eclipse do autoritarismo brasileiro

Marco Temporal: entenda o que é essa tese jurídica e suas consequências

“Tenho medo de sofrer punição do IFood”: relatos da uberização no Brasil

Da exposição à hipocrisia da elite: a trajetória do cadáver de Jacinta Maria de Santana

Brasil Autoritário: vinícolas no RS e o trabalho análogo à escravidão

Escravidão e gênero: o perfil das mulheres exploradas no Brasil atual

Sobreviventes do fracasso na segurança pública do Rio de Janeiro

Assédio moral no trabalho: uma herança da sociedade autoritária brasileira

Dois séculos após a Colônia, escravidão ainda reverbera no Brasil

A uberização é o futuro do trabalho no Brasil?

Crise na aldeia yanomami: Garimpo ilegal e as consequências do colonialismo interno

Laços de “família”

Das vinícolas do RS ao período colonial: como os últimos casos de trabalho análogo à escravidão revelam problemas estruturais do Brasil?

Há sustentabilidade e harmonia na relação entre o agronegócio e os povos indígenas da Amazônia Legal?

Editado por Redação

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