Dominando a política há décadas, o MDB deixa o governo com desaprovação recorde
Em 2017, o Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) tentava se preparar para a corrida eleitoral com algum candidato que abraçasse o legado do governo. Um ano depois e um “P” a menos, Temer deixou de ser uma possibilidade e Henrique Meirelles entrou como pré-candidato, disposto a bancar a própria campanha, longe da unanimidade no próprio partido e com poucas intenções de voto nas pesquisas (entre 0 e 1% para o Datafolha, em junho de 2018). “Não sou candidato do governo, como eu não sou candidato do mercado. Sou candidato do crescimento, do emprego e da renda. Nossa proposta é o avanço contra o atraso”, afirmou Meirelles em entrevista ao jornal mineiro O Tempo.
Temer anunciou o ex-ministro como pré-candidato em um evento chamado “Encontro com o Futuro”, marcado também pelo lançamento de um documento homônimo com o balanço da administração emedebista. No documento, o MDB recorda a aprovação do teto de gastos, a reforma trabalhista e é dado destaque à recuperação da economia e à confiança no crescimento associado à iniciativa privada. Ainda assim, nem esse discurso, nem a realidade conseguiram garantir ao governo o mínimo de aprovação popular. Na última apuração do Datafolha, em junho, 82% dos entrevistados avaliaram o governo como ruim ou péssimo.
Para o cientista político João Alexandre Peschanski, o governo acentuou um processo já corrente na Presidência de “um distanciamento das decisões em Brasília da realidade material das pessoas, em que os atos de governo acabam sendo, em demasia, influenciados pelas dinâmicas do que ocorre entre os Três Poderes”. “É um caso único de governo não eleito que não conseguiu atingir suas ambições. No modo como subiu ao poder [por meio do impeachment de Dilma Rousseff], Temer teve todas condições institucionais e liberdades fiscais”, acredita Peschanski. Entre as causas desse malogro, a falta de coerência nas decisões econômicas, sem a presença de políticas propositivas, voltadas a minimizar os efeitos da crise. Em consequência, Temer não arranjou as condições de sua sobrevivência política ou mesmo preparou o terreno para Meirelles.
Nada mais distante da mobilização que o MDB original causou anteriormente no Brasil – e que não ressurgiu quando o partido quis voltar a ser movimento. Com a instauração do bipartidarismo pelo AI-2 em 1965, o MDB reuniu os então extintos partidos e aglutinou interesses dos movimentos sociais e sindicais da época. Quase trinta anos depois, a sigla parece representar tudo, menos aquela mesma que apoiou as greves em 1979, ou que, encabeçada por Ulysses Guimarães, trabalhou arduamente pela “Constituição Cidadã”, em 1988. Para Peschanski, essa “mudança” pode ser explicada na análise da própria formação do partido. “O MDB não nasce como propositivo, mas como um partido anti-Arena, anti-ditadura. Ele é sempre definido por uma negação”, afirma. “É um partido que acaba englobando de tudo”.
Em 1980, cria-se o PT, e em 1988, o PSDB, e neles vão-se os nomes com os perfis mais alinhados e com tendência ao progressismo. No último racha, Fernando Henrique Cardoso, então líder do PMDB no Senado, chamou a associação de “clientelista e fisiologista”. Trinta anos depois, tais julgamentos persistem na boca de seus críticos, mas os valores do Estatuto do Partido atraem uma renovada ala jovem. Bruno Gabriel, presidente estadual da Juventude Emedebista em São Paulo, afirma que o perfil do movimento é “plural, democrático, com jovens espalhados pela periferia, pela classe empresarial, com os trabalhadores, integrada aos diversos movimentos ligados a cada uma dessas frentes”. Sobre o retorno à sigla MDB, acredita ele que a mudança resgata a história do partido “que sempre representou as massas, do qual todos os outros surgiram. Essa mudança da sigla nos dá a possibilidade de recriar o partido como um todo, investindo e formando novas lideranças”.
Futuramente, nos livros de História, talvez o mandato de Michel Temer como presidente do Brasil fique como a mesóclise nas gramáticas brasileiras. O tipo de colocação pronominal restrita a formas verbais no futuro, praticamente abolida da fala do País, que gera discursos empolados e ações dúbias na maioria dos brasileiros que ouvem tal uso. Mesmo assim, o MDB figura entre as três maiores bancadas de parlamentares, com 51 deputados e 18 senadores que, mesmo não sendo todos da mesma opinião, cheios de brigas internas, são figuras de longa data no sistema político nacional, com muito poder de decisão. Quem quer que seja eleito em outubro, a menos que seja antidemocrático, terá que saber lidar com toda essa longeva elite.